Rev. Fac. Agron. (LUZ). 1998, 15: 58-63

Avaliação da população de protozoários ciliados no rúmen, retículo e omaso e do trato digestivo em búfalos alimentados em três níveis de energia

Evaluation of ciliate protozoa population in the rumen, reticulum and omasum and of the digestive tract in buffaloes fed on three energy levels

Recibido el 06-07-1997l Aceptado el 10-12-1997
1. Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da Universidade de São Paulo, Campus de Pirassununga, 13630-000-Pirassununga-SP, Brasil; e.mail: [email protected]

Raul Franzolin1, Maria Helena Tieghi Franzolin e Juliano Roberto da Silva

Abstract

Three groups of six buffalo males each were fed on three energy levels: LE (Low Energy), RE (Required Energy) and HE (High Energy) in feedlot for around 140 days. RE was calculated with 125 Kcal ME/ kg0.75 to maintenance; LE with 20% below and HE with 20% above, estimating a gain weight of 800 g/d. Grass hay was used as roughage; the concentrate was a mixture of grain corn ground and soybean meal and composed 39.8% (LE), 48,5% (RE) and 58,1% (AE). Average slaughter body weight was 449 kg and samples of contents from rumen, reticulum and omasum were collected to protozoology study. Daily average dry matter intake was 92,1 g/kg0.75 and estimated energy intake (Kcal/kg0.75) were 201,23 (LE), 223,32 (RE) and 241,20 (HE). There was difference (P<0,05) only in weight of omasum contents between the treatments that was lower in HE. Total protozoa concentration was similar in the rumen and reticulum (mean 76,27 x 104/mL) and low in the omasum (9,64 x 104/mL). Diplodiniinae species was predominant in LE and RE and Entodinium in HE. The average proportion Entodinium:Diplodiniinae in reticulo-rumen were 0,83 (LE and RE) and 2,53 (HE) and in omasum 0,48 (LE and RE) and 1,53 (HE).
Key words: protozoa, rumen, omasum, energy, buffaloes

Resumen

Tres grupos de seis búfalos machos cada uno fueron alimentados con tres niveles energéticos: BE (Baja energía), RE (Energía requerida) y AE (Alta energía) en confinamiento durante alrededor de 140 días. RE fue calculado con 125 Kcal ME/ kg0.75 para mantenimiento; BE con 20% debajo y AE con 20% por encima, estimando una ganancia de peso de 800 g/d. Heno fue utilizado como forraje; el concentrado fue una mezcla de grano de maíz molido y harina de soya y ajustado a 39,8% (BE), 48,5% (RE) and 58,1% (AE). El promedio de peso al sacrificio fue de 449 kg y muestras de los contenidos ruminales, reticulares y omasales fueron colectados para estudios de protozoología. El consumo diario de materia seca fue de 92,1 g/kg0.75 y los consumos de energía estimados (Kcal/kg0.75) fueron: 201,23 (BE), 223,32 (RE) and 241,20 (AE). Hubo diferencias (P < 0,05) sólo en el peso de los contenidos omasales entre los tratamientos HE. La concentración total de protozoos fue similar en el rumen y retículo (promedio de 76,27 x 104/mL) y menor en el omaso (9,64 x 104/mL). Especies de Diplodiniinae fueron predominantes en BE y RE y Entodinium en AE. La proporción promedio Entodinium: Diplodiniinae en el retículo-rumen fueron 0,83 (BE and RE) y 2,53 (AE) y en el omaso 0,48 (BE y RE) y 1,53 (AE).
Palabras claves: Protozoarios, rumen, omaso, energía, búfalos.

Introdução

O búfalo (Bubalus bubalis) é um ruminante com alto potencial produtivo de carne e leite para os trópicos devido a sua grande adaptação nessa vasta região. Entretanto, há necessidade de maiores conhecimentos de suas características nutricionais, incluindo os hábitos alimentares, capacidade do trato digestivo, microrganismos ruminais, entre outras.

Os protozoários, bactérias e fungos existentes no rúmen-retículo constituem a população de microrganismos responsável pela digestão de nutrientes, principalmente os carboidratos complexos da parede celular das plantas, porém, o real papel dos ciliados ainda não está claramente estabelecido. O tipo da dieta e o nível energético da ração influenciam na concentração e composição da fauna ruminal através da ação direta ou indireta pelos efeitos sobre o pH e a taxa de passagem do conteúdo ruminal. Dennis et al. (3) e Franzolin & Dehority (6) observaram aumento de protozoários no rúmen de bovinos com a adição de concentrado até 75% na ração, sendo que Entodinium representou cerca de 90% da fauna. Franzolin (4) observaram predominância de Diplodiniinae na fauna ruminal em búfalos (54,9%) e de Entodinium em Bovinos (79,2%) alimentados com dieta à base de cana de açúcar e concentrado durante 13 semanas.

Experimentos realizados em nossa universidade indicam que os búfalos apresentam maior proporção dos grandes ciliados pertencentes a subfamília Diplodiniinae em relação aos pequenos entodinios. O presente trabalho teve por objetivo avaliar os efeitos da alimentação em três níveis de energia em búfalos sobre a população de protozoários no rúmen, retículo e omaso e pesos dos diferentes segmentos do trato digestivo.

Material e métodos

Três grupos de 6 machos bubalinos cada foram alimentados em três níveis de energia: BE (baixa energia), RE (requerida energia) e AE (alta energia) em confinamento durante aproximadamente 140 dias. RE foi calculado com 125 kcal EM / kg0,75 para mantença; BE com 20% abaixo e AE com 20% acima. Para energia de ganho de peso adotou-se ganho médio diário de 800 g com 10 Kcal de EM/g de ganho para animais até 250 kg e mais 0,02 Kcal/ kg de peso acima de 250 kg, conforme recomendações de Kearl (7). As rações foram formuladas com feno de coast-cross (Cynodon dactylon) como volumoso e milho em grãos moídos e farelo de soja como concentrado e a ingestão de energia metabolizável foi estimada com valores de EM dos ingredientes recomendados para búfalos por Kearl (7).

Os animais foram pesados a cada 21 días e as rações recalculadas. Quando atingiram o peso de 450 a 500 kg, foram abatidos após jejum mínimo de 14 horas. Em seguida, os segmentos do trato digestivo eram amarrados, separados e pesados (peso bruto), dêpois lavados em água corrente e pesados novamente (peso líquido). Amostras dos conteúdos do rúmen, retículo e omaso foram coletadas de vários pontos de cada local formando um "pool" e foram fixadas em solução de formaldeído 1:2 para identificação e contagem de protozoários ciliados conforme técnica descrita por Dehority (1).

Os dados obtidos foram analisados estatisticamente pela análise de variância (ANOVA) para experimento inteiramente aleatório em computador. As médias dos tratamentos foram comparadas pelo teste de "LSD" utilizando-se o número total de protozoários como covariável.

Resultados e discussão

O feno utilizado foi de baixa qualidade com teor de proteína bruta (PB) de 6,26% e de fibra em detergente neutro (FDN) de 75,65%. As rações apresentaram teor médio de 12,02% de PB com porcentagens de concentrado de 39,8% (BE), 48,5% (RE) e 58,1% (AE).

A ingestão de matéria seca (MS) em g / kg0,75 foi maior (P < 0,05) em AE (95,0) que em BE (88,2) com RE intermediário (93,1) e foi ligeiramente inferior àquela recomendada por Kearl (7) para búfalos em crescimento que é de 97,4 g MS / kg0,75. As ingestões médias de energia metabolizável / kg0,75 foram de 210,23 Kcal (BE), 223,32 Kcal (RE) e 241,20 Kcal (AE).

Na tabela 1 encontram-se os valores dos pesos médios dos diferentes segmentos do trato digestivo. Houve diferença significativa (P < 0,05) somente no peso do conteúdo do omaso entre os tratamentos que foi menor nos animais alimentados com nível alto de energia.

Não houve diferença significativa (P > 0,05) no total de protozoários entre os tratamentos, mas observou-se tendência a menor concentração no nível mais energético (AE) no rúmen e retículo e maior no omaso (tabela 2). A concentração média total de ciliados foi praticamente a mesma no rúmen (76,18 x 104/mL) e no retículo (76,35 x 104/mL) e menor no omaso (9,64 x 104/mL). A composição da fauna foi alterada nos três compartimentos gástricos dos níveis BE e RE para AE. Diplodiniinae predominou em BE e RE (E:D <1) e Entodinium em AE (E:D > 1) concor-dando parcialmente com achados de que a adição de concentrado com maior teor de amido na ração de ruminantes favorece a população dos pequenos ciliados entodinios e também com citações de que os búfalos têm apresen-tado altas proporções de Diplodiniinae (4, 5). A relação Entodinium: Diplodiniinae (E:D) foi menor no omaso do que no rúmen e retículo nas três rações, principalmente em baixa energia, indicando maior passagem de Diplodiniinae do rúmen-retículo para o omaso. A composição de holotricos foi mais alta em BE e RE do que AE nos três compartimentos e foi mais elevada no retículo nos três níveis de energia indicando um possível nicho ecológico nesse compartimento concordando com os achados De Dehority e Tirabasso (2) em ovinos.

Tabela 1. Pesos médios (kg) dos animais e dos diferentes segmentos do trato digestivo de búfalos sob dieta com três níveis de energia.

  Níveis de ingestão de energia    
  Baixa energia Requerida energia Alta energia Média geral EPM1
Peso médio no confinamento 390,75  370,50 383,67 381,64 10,06
Peso de abate 451,83 439,83 456,67 449,33 9,43
Rúmen-Retículo 9,92 9,80 9,90 9,87 0,27
Omaso  3,70 3,30 3,43 3,48 0,20
Abomaso 2,07 2,12 2,15 2,11 0,17
Intestino grosso  6,45 6,22 6,10 6,26 0,33
Intestino delgado  6,33 6,02 6,75 6,37 0,25
Conteúdo Rúmen-Retículo  27,07 25,90 25,93 26,30 1,59
Conteúdo Omaso  2,97a 2,72a 1,93b 2,54 0,17
Conteúdo Abomaso 1,28 1,21 1,27 1,26 0,07
Conteúdo Intestino grosso 1,72 1,35 1,33 1,47 0,11
Conteúdo Intestino delgado 2,20 2,15 2,20  2,18 0,11
Conteúdo Gastrointestinal 35,23 33,33 34,80 34,45 1,40

1 EPM. - Erro padrão da média; a,b Valores seguidos com letras diferentes na mesma linha diferem significativamente (P < 0,05); ausências de letras correspondem à valores semelhantes.

Tabela 2. Concentração (número x 104/mL), composição (% entreparentesis) e relação Entodinium:Diplodiniinae da fauna no rúmen, retículo e omaso em búfalos sob alimentos em três níveis de energia.

  Níveis de ingestão de energia  
  Baixa energia  Requerida energia Alta energia EPM.1
Rúmen        
Entodinium 30,83a (44,0) 36,02a (39,8) 47,90b (70,4)  5,44
Diplodiniinae 32,72ab (46,7) 42,85a (47,4) 18,24b (26,8) 4,47
Epidinium 1,68b (2,4) 4,58a (5,6) 1,25b (1,8)  0,65
Isotricha 1,28a (1,8) 1,03ab (1,1) 0,37b (0,5) 0,18
Dasytricha 3,53ab (3,5) 5,97a (6,6) 0,32b (0,5) 0,81
Total 70,03a 90,44ª 68,08a 8,94
Entod.:Diplod. 0,94 0,84 2,63  
Retículo        
Entodinium 33,44ab (38,1)  27,32a (33,2) 39,27b (66,6) 4,48
Diplodiniinae 42,59a (48,5)  37,39a (45,4) 16,23b (27,5) 4,93
Epidinium 3,71a (4,2) 7,29b (8,9) 1,25a (2,1) 1,04
Isotricha 2,78a (3,2) 2,01a (2,4) 1,42a (2,4) 0,30
Dasytricha 5,30a (6,0) 8,29a (10,1) 0,76a (1,3) 1,73
Total 87,81a 82,29ª  58,94a 9,55
Entod.:Diplod. 0,79 0,73 2,42  
Omaso        
Entodinium  2,06a (24,0) 1,68a (31,1) 8,75b (58,6) 1,24
Diplodiniinae 5,91a (68,8) 2,75b (50,9) 5,73a (38,4) 1,03
Epidinium 0,51a (5,9) 0,62a (11,5) 0,44a (3,0) 0,17
Isotricha 0,06a (0,7) 0,04a (0,7) 0,00a (0,0) 0,02
Dasytricha 0,06a (0,7) 0,30b (5,6) 0,00a (0,0)  0,05
Total 8,59a 5,40ª 14,92a 2,01
Entod.:Diplod. 0,35 0,61 1,53  

1EPM - Erro padrão da média; a,b Valores seguidos com letras diferentes na mesma linha diferem significativamente (P < 0,05).

Conclusões

Búfalos alimentados com menores níveis de energia apresentaram fauna no rúmen, retículo e omaso com predominância de Diplodiniinae enquanto com nível mais elevado houve predominância dos entodinios. Os níveis de energia não influenciaram nos pesos dos diferentes segmentos do trato digestivo, exceto no conteúdo do omaso que foi menor com dieta mais energética.

Literatura citada

Dehority, B. A. 1993. Laboratory manual for classification and morphology of rumen ciliate protozoa. CRC Press, Inc., Florida.

Dehority, B.A. and P. A. Tirabasso. 1989. Factors affecting the migration and sequestration of rumen protozoa in family Isotrichidae. J. Gen. Microbiol. 135:539-548.

Dennis, S.M., M. J. Arambel, E. E. Bartley and A. D. Dayton. 1983. Effect of energy concentration and source of nitrogen on numbers and types of rumen protozoa. J. Dairy Sci. 66:1248-1254.

Franzolin, R. 1996. Comparação da fauna ruminal e da degradabilidade da dieta entre búfalos e bovinos zebuínos alimentados a base de cana-de-açúcar. Pirassununga, Brasil. 78 p. Tese de Livre-Docencia, FZEA/USP.

Franzolin, R. 1994. Feed efficiency: a comparison between cattle and buffalo. Buffalo Journal, (Supplement 2):39-50.

Franzolin, R. and B. A. Dehority. 1996. Effect of prolonged high-concentrate feeding on ruminal protozoa concentrations. J. Anim. Sci. 74:2803-2809.

Kearl, L.C. 1982. Nutrient requirements of ruminant in development contries. Section 10. Domestic buffalo. Utah State University, Logan, Utah, USA, p. 89-113.